sexta-feira, 26 de abril de 2013

O jantar de encerramento das comemorações


Naquela tarde o sol estava tímido e Alberto decidiu não ir para o alpendre. Depois de um dia como aquele só lhe apetecia o silêncio do fim de tarde e beber um gin com água tónica. Era sexta-feira e tinha que ir representar o ISCAC no jantar de encerramento dos 125 Anos da ESAC. Não era o que tinha planeado para aquela noite, tinha que cancelar o jantar com a Catarina.
 
Alberto iria celebrar o seu 50º aniversário na semana seguinte, estava divorciado há 10 anos e desde então sempre teve várias relações fugazes. Era um homem inteligente, charmoso, simpático, e desde que se divorciou decidiu nunca mais ter uma relação de longa duração, apenas fins-de-semana, sem compromissos, sem responsabilidades. Às vezes cansava-se da futilidade, frieza e interesse de algumas delas. Catarina era uma delas, mas tinha um corpo deslumbrante e só de pensar nisso ficava excitado.

Tal como tinha previsto, o jantar estava a ser aborrecido, conhecia a maior parte daqueles rostos, antevia as conversas, os sorrisos, os cumprimentos. Mais meia hora e poderia ir embora. Enquanto bebia café acabou por ouvir a conversa das duas mulheres que se encontravam ali, uma deveria ter cerca de 45 anos e a outra 35 anos, a mais velha era muito bonita, tinha olhos verdes, um cabelo longo castanho claro e era o tipo de mulher que Alberto costuma seleccionar para sair, aliás tinha a certeza de que já se tinha cruzado com ela, deveria ser professora ali na ESAC. A mais nova chamava-se Renata, era assim que a outra mulher a tinha chamado, estava quase à sua altura, sem aqueles saltos deveria ter cerca de 1,70 mt de altura, olhos castanhos, delineados a preto, cabelo de cor preto, com uns lindos caracóis e acima dos ombros, vestia calças pretas e blusa branca com um decote tentador. Costumava escolher mulheres que tivessem o cabelo longo, aliás muito longo e de baixa estatura, Renata era alta e tinha um corpo reboliço.

Aquela mulher de olhar brilhante estava a dizer que estava cansada de ser assediada por homens casados, que o ideal seria arranjar um homem que à sua semelhança não fosse comprometido e quisesse ter um encontro sem compromissos, sem exigências, alguém que não falasse da sua vida pessoal, dos seus problemas, que não se exibisse, apenas uma noite de sexo e no fim cada um iria para sua casa, sem despedidas, sem beijos, sem promessas, apenas um “até depois”. O ideal seria a noite de lua cheia, para ela aquela era a noite dos amantes.

Parecia-lhe muito tentadora aquela mulher, que como ele apenas procurava um pouco de sexo sem compromissos, sem conversas do tipo; o que fazes,  quanto ganhas, que idade tens, onde passas férias… estava tão cansado de mulheres que queriam sempre alguma coisa dele. Renata parecia muito nova para querer um homem apenas uma noite por mês e sentia curiosidade, será que algum homem a tinha magoado assim tanto ao ponto de não querer mais nenhuma relação.

Decidiu escrever o seu número de telemóvel e o seu e-mail num papel, dobrou e quando passou junto a Renata, pediu desculpa, entregou-lhe o papel na mão e disse quase junto do seu ouvido:

 - Pretendo também apenas uma noite por mês de sexo sem compromissos e sem promessas, tens aí os meus contactos.

Renata ficou sem palavras, não se tinha apercebido de que aquele homem alto e distinto que estava a beber café tinha ouvido a sua conversa. Ficou muito corada e não conseguiu pronunciar nenhuma palavra, guardou o papel no bolso das suas calças e tentou retomar a conversa com a sua prima Carolina.

Renata foi àquele jantar porque a sua prima Carolina que era professora na ESAC tinha insistido muito, desde que tinha ficado viúva, que não tinha vontade de sair à noite, preferia o sossego do seu apartamento com vista para o Parque verde, ali junto ao Rio Mondego. Tinha estado a comentar com Carolina que estava cansada dos homens casados que a assediavam só porque era viúva, julgavam que estava carente e disponível para qualquer homem. Era a relações públicas na Quinta das Lágrimas, dedicava-se muito ao seu trabalho e quando não estava a trabalhar aproveitava para visitar os seus pais que tinham uma quinta em Pombal.

Já em casa, Renata desdobrou o papel que aquele homem lhe tinha entregue, ainda sentia o perfume da pele dele junto ao seu ouvido. Era um homem alto, cabelo grisalho, voz firme, olhos de cor azul do mar, e um sorriso discreto. O papel tinha um número de telemóvel e um e-mail “a_reis”, sorriu e guardou o papel na sua agenda, um dia destes ainda teria coragem para o contactar.

 

 

terça-feira, 23 de abril de 2013

Dia de Páscoa


No dia de Páscoa Filipa acordou sobressaltada, a campainha não parava de tocar, quem estaria a tocar à campainha, pensou enquanto se levantava. Não sabia que horas eram, tinha demorado a adormecer.
 
Quando viu que era António sentiu um aperto dentro dela, um misto de felicidade e de preocupação.

 - O que se passa contigo Filipa, não me querias deixar entrar?! – sorriu, mas ao ver o rosto de Filipa, percebeu que ela não estava nada bem e abraçou-a imediatamente. Estava muito pálida, os olhos estavam muito inchados, de certeza que tinha estado a chorar, tinha olheiras já profundas. Filipa estás doente?

Filipa estava a chorar. Não sabia o que fazer, afastou-se um pouco e puxou-a para dentro de casa. Obrigou-a a olhar para ele, levou os seus dedos ao rosto dela para lhe limpar as lágrimas. Ela fechou os olhos e ele sentiu uma dor imensa dentro dele, sabia que ela estava assim por causa dele.

 - Desculpa – conseguiu dizer Filipa.

 - Não peças.

 - António preciso de te dizer uma coisa muito importante.

 - Diz – o que seria que ela iria dizer, que não o queria ver mais. Iria entender, mas não o conseguiria fazer, mais do que nunca sabia que o seu lugar era ali junto dela.

 - Vamos para a sala.

António seguiu Filipa, deixou-a sentar-se no sofá e depois sentou-se ao seu lado.

 - António… naquele dia em que soubeste que a Margarida estava grávida eu tinha uma coisa muito importante para te contar, mas depois não tive coragem e deixei-te ir embora.

 - O que tinhas para me dizer Filipa? – sentia-se muito angustiado.

 - Eu estou grávida.

António ficou em silêncio, não sabia o que dizer, o que pensar. Sentia uma felicidade muito grande. Temia que ela lhe fosse dizer que estava gravemente doente. Mas ela estava grávida, existia a possibilidade de um futuro deles, de uma família.

 - Filipa tu estás muito mais magra, está tudo bem com o bebé e contigo? – conseguiu finalmente dizer e puxou-a para ele, tocou-lhe na barriga, depois agarrou-lhe o rosto e beijou-a. As saudades que tinha dela, dos seus lábios, dos seus beijos. Porque não me disseste antes Filipa?

 - Porque não queria estragar a tua felicidade.

 - A minha felicidade é aqui junto de ti.

 - António naquele dia, depois do que a Margarida te disse, vi no teu olhar esperança, esperança de recuperar o amor perdido, a família.

 - A notícia de que ia ser pai apanhou-me de surpresa, até porque imaginava-me a ser pai dos teus filhos. Depois senti que não podia abandonar a Margarida e tu abriste-me essa porta. Mas o meu coração ficou aqui e eu vim para o recuperar.

 - Abraças-me António?

 - Anda cá meu amor – abraçou-a durante muito tempo, quando sentiu que Filipa estava mais calma afastou-a suavemente e beijou cada pedacinho do seu rosto. Filipa já foste ao médico?

 - Sim.

 - E o que disse acerca do teu peso? Não deverias estar a ganhar peso?

 - Disse que para já não estava a prejudicar o bebé, mas para ter cuidado.

 - Quando é a próxima consulta?

 - Na próxima semana.

 - Posso ir contigo?

 - Queres ir?

 - Muito. Quero estar sempre presente.

 - E a Margarida?

 - Ela voltou para o Porto e para o antigo namorado. Não te preocupes com ela.

 - E tu como estás?

 - Eu? Eu estou bem, estou aqui contigo e não tenho intenção de ir embora.

 - Tens a certeza?

 - Sim, certeza absoluta – viu que os olhos de Filipa adquiriam um novo brilho.

 - E agora?

 - Agora… Vais tomar banho, vestir-te e depois vamos tomar o pequeno-almoço. Combinado?

 - Sim – sorriu timidamente.
 
Enquanto Filipa tomava banho, António preparava papas de aveia com pêra, ainda se lembrava do quanto Filipa adorava comer papas de aveia. Não iria colocar canela, sabia que as mulheres grávidas não deviam ingerir canela. Foi generoso com a quantidade de mel, estavam quase prontas, só precisavam de descansar uns minutos, entretanto iria ver como estava Filipa. Quando entrou no quarto sentiu o aroma do perfume dela, ela estava a vestir-se e sorriu-lhe.